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fevereiro 13, 2005

Verei por ti 



Unamuno e Gustavo Adolfo Bécquer representam dois dos expoentes da poesia espanhola do final do século XIX. Inicia-se com eles o Modernismo, que em Portugal principiou com a revista Orpheu (em 1915).
Contudo, Miguel de Unamuno não encaixava no Movimento; exaltava a pátria, a sua Espanha que lhe doía.

Verei por ti ilustra a grandeza espiritual deste poeta.


«Desconheço-me», dizes, mas olha, tem por certo
que a conhecer-se começa o homem quando clama
«Desconheço-me» e chora;
a seus olhos então o coração aberto
da sua vida encontra a verdadeira trama;
é então sua aurora.

Não, ninguém se conhece, até que o toca
a luz de uma alma irmã que do eterno chega
e seu fundo ilumina;
teu íntimo sentir floresce em minha boca,
tens a vista em meus olhos, vê por mim, minha cega,
vê por mim e caminha.

«Estou cega», dizes-me; apoia-te em meu braço
e alumia com teus olhos nossa áspera via
perdida no futuro;
verei por ti, confia; tua vista é este laço
que a ti me atou; meu olhar a garantia
de um caminhar seguro.

Que importa que os teus não vejam o caminho,
se dão luz aos meus e me iluminam todo
com seu tranquilo lume?
Apoia-te em meus ombros, confia-te ao Destino,
verei por ti, ó cega, afastar-te-ei do lodo,
levar-te-ei ao cume.

E ali, na luz envolta, abrir-se-ão teus olhos,
verás como esta senda atrás de nós, distante,
se perde na distância
e nela desta vida os míseros restolhos,
e aos reflexos do céu abrir-se-nos, radiante,
o que hoje é esperança.

Miguel de Unamuno (1864-1936)
in Antologia da Poesia Espanhola Contemporânea
Selecção e tradução de José Bento

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