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junho 11, 2005

Contas de Mercearia.. 

Excertos / sublinhados do artigo de hoje no Público.
Desta Tempestade no Deserto, de que lado vem a areia que nos cega?!


O Orçamento de Estado Para 2005

António Bagão Félix

1.Como é óbvio, não podem ser olhados do mesmo modo uma estimativa de um défice orçamental e um défice já concretizado numa conta do Estado.

2.Levar até às centésimas uma estimativa do défice (6,83 por cento) é ridículo.

Tratando-se de uma previsão, só se entende como uma forma de impressionar, pela aparente infalibilidade de um inatacável rigor técnico que não deixa margem para discussão pelo comum dos mortais, e de poder justificar o serôdio "espanto" que branqueasse promessas eleitorais.

4. A injustiça subjacente à comparação de uma previsão feita quatro meses antes com um cálculo produzido cinco meses depois do ano em causa, até poderia ter conduzido a valores de défice estimado ainda maiores. Bastaria prever factos ou situações que em Setembro de 2004 só poderiam estar na mente de visionários, mas que em maio deste ano são já uma certeza.

Um exemplo: os efeitos da seca.

5. Importante é sublinhar que a passagem dos 2,9 por cento do défice do OE aprovado para os 6,83 por cento do relatório resulta, em boa parte, de alterações metodológicas, contabilísticas, de orientação política que, naturalmente, não poderiam ser relevadas pelo anterior Executivo e de previsões macroeconómicas seguramente mais acertadas em Maio de 2005, quando comparadas com as feitas no tempo de Elaboração do OE (Setembro de 2004).

6. Aliás, esta metodologia foi por mim utilizada (15 dias depois de ter tomado posse) em relação ao próprio OE de 2004 e de que, então, informei o Primeiro-Ministro e o Conselho de Ministros. Utilizando um processo semelhante ( défice previsto no OE 2004 + receitas extraordinárias previstas + descativação parcial + ajustamentos nos fundos e serviços autónomos + défice estimado para o SNS), cheguei a um valor estático do défice de 6,4 por cento.

7. Este método de avaliação do défice – que eu próprio utilizei – tem, no entanto, a debilidade técnica de adicionar parcelas de natureza bem diversa, quer do lado das alternativas de receita, quer da orientação da despesa. Em português popular, é como somar batatas com feijões. Este exercício, feito nas mesmas condições para os vários anos orçamentais anteriores, daria por certo valores desta ordem de grandeza.

8. O importante é que, tendo consciência disso, se procure executar o Orçamento, de modo a procurar atingir o valor estimado inicialmente.

9. Ora, o défice estimado pela Comissão é o valor que se corre o risco de atingir, se nada se fizer.

12. Aliás, para quem parece ter concentrado a crítica nos três meses de plena capacidade do anterior Governo (que, segundo uns tantos iluminados, quase parece responsável por 30 anos de descontrolo das contas públicas..) é necessário lembrar que o actual Executivo é o responsável por dez meses de execução orçamental deste ano. Tem, pois, possibilidade de agir bem e a tempo. Recordo ainda que nos primeiros dois meses de execução orçamental deste ano, a herança recebida foi positiva, com um crescimento da receita dos impostos muito significativo.

13. Nunca é demais relembrar como foi perdida a última grande oportunidade de consolidar as contas públicas na última década em Portugal: a queda dos juros fez diminuir o seu peso na despesa do Estado de 6,3 por cento do PIB em 1995 para 3,2 em 2001. Uma diferença de 3,1 por cento do PIB que, acrescida de uma fase favorável do ciclo económico, só por si teria possibilitado uma reforma orçamental com menores custos sociais. E o que se fez? Transferiu-se essa poupança nos juros da dívida pública para mais despesa primária - e mais Estado.(...)

18. No que se refere às cativações e dotação provisional, dar de barato a descativação de verbas é uma atitude conformista e despesista. Evidentemente que se sabe de antemão que algumas verbas terão de ser libertadas, mas dispensar os ministérios de provar a sua estrita necessidade - é meio caminho andado - não só para gastarem o valor livre de cativações, como para excederem esse valor.

19. Quanto ao défice da Segurança Social, agora melhor estimado, a quase totalidade explica-se pela menor receita das contribuições. É fácil reconhecer que é mais aproximado um valor previsto já com quatro meses de execução no próprio ano, do que quatro meses antes de entrar no ano em que se tem de fazer uma projecção de cobrança para o ano seguinte.

20. Quanto à não previsão dos encargos com as SCUT, não se tratou de lapso ou incorrecção, mas de opção política de com elas acabar. O futuro dirá quem tem razão.

21. O Relatório reconhece ainda que a previsão do lado das receitas fiscais é atingível, aspecto importantíssimo e não divulgado publicamente.

23. Em conclusão: o valor de 6,83 por cento tem de ser entendido como um respeitável exercício, mas não pode ser visto como um ponto de partida para um objectivo político audaz e inconformista. A não ser que se considere como tal realizar o milagre de, em dez meses, se passar de 6,83 por cento ( ou 6,5 já com a revalorização do PIB) para 6,2 por cento. Ou que até se superem todas as exppectativas e se chegue a uma décimas abaixo. A ilusão de óptica na política é sempre mais convincente, quanto mais escuro é o quadro que nos dão a olhar.


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